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O que há de novo nas pesquisas sobre Educação

Elisa Marconi e Francisco Bicudo

Para o segundo semestre de 2009 e para o primeiro de 2010, o programa de pós-graduação em Educação da Universidade de São Paulo (USP) oferece 89 vagas de mestrado, em nove linhas de pesquisa, e outras 89 para o doutorado (nesse caso, são oito ou 10 vertentes de estudos, dependendo do semestre de inscrição). Já a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) disponibiliza em seus quatro programas de pós-graduação em Educação 178 vagas, distribuídas por mestrado acadêmico, mestrado profissionalizante e doutorado. Os números chamam atenção pela grandeza e certamente refletem o interesse de parcela significativa de universitários dispostos a continuar refletindo sobre dilemas e questões educacionais. Mas o que de fato nessa área chama a atenção dos candidatos e quais são atualmente os temas que instigam os futuros pesquisadores, em um segmento invariavelmente visto como pouco atraente?

Romualdo Portella de Oliveira, professor da Faculdade de Educação da USP (FEUSP) e atual coordenador da pós-graduação da unidade, busca auxílio na história e revela que em tempos atuais as áreas de interesse de mestrandos e doutorandos não são muito diferentes das procuradas há 30 anos, época em que a pós-graduação foi implantada na instituição. Contudo, o olhar mudou um pouco, assim como os focos principais de reflexão, além das formas de aplicação do conhecimento produzido, “acompanhando os tempos contemporâneos”, segundo ele. A questão da qualidade, por exemplo, vem ganhando cada vez mais espaço nas aulas do mestrado e do doutorado. Trata-se de um assunto que sempre despertou interesse, mas tem aparecido com mais intensidade nos últimos tempos. “Do ponto de vista da política educacional, nossos alunos estão muito sensíveis a essa discussão. Mas ela não se esgota aí. Aqui também tem gente estudando e propondo uma nova conceituação e ainda novas metodologias para aferição e para a implantação dessa dimensão da qualidade nas escolas”, revela Oliveira.

A professora Wanda Junqueira de Aguiar, coordenadora da pós-graduação em Psicologia da PUC-SP, concorda com as reflexões apresentadas pelo colega da USP. Segundo ela, a qualidade de ensino continua sendo uma das principais referências dos estudos produzidos na área. E uma das razões para que isso esteja acontecendo, segundo a professora da PUC-SP, é a exposição do assunto para a sociedade, por meio dos veículos midiáticos. “Seja na divulgação de reportagens sobre a deterioração ou sobre as notas dos estudantes nos exames públicos, a questão de fundo do noticiário sempre tange a qualidade. Essa é uma preocupação real da sociedade, e a academia reflete isso”, afirma. Romualdo reforça a tendência explicando que o debate público – em parte embasado pela produção de conhecimento que acontece na pós-graduação – acaba ainda que de forma indireta refletindo-se nas políticas públicas, embora admita que não é muito comum saírem formuladores de projetos educacionais (municipais, estaduais ou nacionais) dos bancos das universidades. Para ele, são dois perfis distintos de atuação – os que pensam e os que executam. O educador destaca no entanto que o direcionamento e os conteúdos das pesquisas desenvolvidas influenciam na tomada de decisão dos gestores. “E é para isso que o embate de idéias deve servir mesmo”, defende Oliveira. E, se nem sempre os mestrandos e doutorandos têm as canetas decisórias nas mãos, eles certamente têm outra ferramenta poderosa: o giz. “Aqui na PUC, a maioria dos pós-graduandos em Educação são professores. Tem gente da rede oficial de ensino e gente da rede particular, da pré-escola ao nível universitário, e nós acompanhamos a trajetória dos egressos até três anos depois de titulados. O que a gente vê é a aplicação, ou pelo menos uma forte tentativa, de levar a qualidade discutida aqui para o cotidiano e a realidade de sala de aula”, completa Wanda.

“As linhas dentro dessa grande área debatem essencialmente o aprender melhor e a relação da qualidade com a docência, ou seja, o papel do professor nessa busca pela qualidade na educação”, acrescenta o coordenador da pós-graduação em Educação da Universidade de São Paulo. No mestrado em Psicologia da Educação da PUC-SP, a vertente da formação de professor aliás se desdobra em diversos outros caminhos, procurando compreender os dilemas e as dificuldades enfrentados pelos educadores nesse processo, além de sugerir novas alternativas para que o professor saia da graduação mais bem formado, subsidiado por conteúdos atuais e relevantes e com real poder de intervenção em sua disciplina, em sua sala de aula, nas diretrizes da escola onde leciona e, por que não dizer, até mesmo na proposição de políticas públicas.

“Já faz algum tempo que o discurso ligado à qualificação do professor ganhou notoriedade, mas recentemente isso vem ficando ainda mais forte”, lembra Oliveira. “Casos como o dos professores ligados à Secretaria Estadual de Educação que tiraram zero no exame chamam a atenção da sociedade, do professorado e dos cursos de formação desses profissionais e toda essa observação acaba se refletindo nas pesquisas”, diz. Entre os trabalhos desenvolvidos na USP, a maioria se debruça sobre três zonas de interesse: o aumento da atratividade para a profissão, o que inclui um esforço para que os melhores alunos sigam para o magistério e ali permaneçam; o desenvolvimento de melhores estratégias e ferramentas para formar melhor o professor e, por último, uma vez atraído para o magistério, a necessidade de fazer com que o professor permaneça ligado à atividade. “E essa questão passa, claro, pelo salário, pelo plano de carreira, pela percepção social do papel do docente e pela valorização geral desse profissional”, explica Oliveira.

Além da qualidade de ensino e da formação docente, um terceiro tópico apontado pelos dois coordenadores como alvo de debates e de estudos é a alfabetização. “De uma maneira geral, o método global e o método fônico ainda brigam de igual para igual aqui entre nossos alunos”, revela o professor da USP. Longe de chegarem a uma resposta única e cabal, os pesquisadores de uma linha e de outra têm sempre bons exemplos e boas aplicações para mostrar em seus trabalhos. E o papel da universidade é justamente incentivar a pluralidade dos estudos, porque acredita que a educação de qualidade pode ser alinhada com todas as correntes importantes da pedagogia. Wanda reforça: a escola defendida pelo pesquisador da educação vai muito além da alfabetização e se projeta por todo o período escolar, buscando a melhor aprendizagem. Por isso a divergência é saudável e ajuda a construir argumentos e a embasar as discussões. Os dois lembram, no entanto, que o embate entre as escolas teóricas, em geral, não é bem compreendido pela população, porque fica muito restrito ao ambiente acadêmico.

Em linhas gerais, os dois coordenadores acreditam que o mestrado e o doutorado em Educação acompanham as questões atuais colocadas pela sociedade – ou seja, o que emerge no chamado espaço público chega às carteiras da pós-graduação e transforma-se em objeto de estudo. O caminho contrário é que em geral não flui tão bem. As discussões e o conhecimento produzidos nas pesquisas nem sempre chegam às políticas públicas, às salas dos professores e ao cotidiano do aluno depois que ele sai da escola. Para Oliveira é difícil mensurar quanto do que é pesquisado transforma-se efetivamente em aplicações concretas para a sociedade. Para ele, existem alguns dados relacionados, por exemplo, ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e ao Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade), que mobilizam os brasileiros e levantam questões pertinentes aos mesmos assuntos debatidos na pós-graduação. Os resultados obtidos nessas provas pelos estudantes brasileiros são piores do que os alcançados por alunos de outros países, em avaliações semelhantes? Esses instrumentos de mensuração são de fato os mais pertinentes e adequados? São apenas duas das perguntas que sempre surgem, por ocasião da divulgação dos resultados desses exames. O que Oliveira lamenta é o fato de o principal canal de reverberação dessas informações ser a imprensa, e somente nesses momentos pontuais. A ponte principal deveria ser o professor que, formado em uma graduação de qualidade, “trava contato com a literatura clássica sobre a educação e com as pesquisas mais importantes e mais recentes. Esse professor estará futuramente na sala de aula e naturalmente as informações com as quais travou contato na faculdade chegarão a seus alunos e à sociedade”, defende.

No entanto, Oliveira retoma as reflexões sobre a distância que muitas vezes se estabelece entre a universidade e a realidade cotidiana para lembrar que há momentos em que essa ponte acaba não se construindo. Wanda já destacou que na PUC a maioria dos mestrandos e doutorandos é formada por professores; já na USP, o perfil do pós-graduando é outro. “Os professores da rede oficial de ensino são a maioria dos candidatos, mas a maior parte dos pesquisadores que entram de fato é constituída por aqueles alunos que já na graduação se dedicavam à pesquisa e optaram por continuar na carreira acadêmica”, explica Oliveira. O professor admite que a falta de contato com a sala de aula pode prejudicar o entendimento de algumas dificuldades reais que os educadores enfrentam. Por outro lado, o olhar afastado em geral não está contaminado por essas mesmas dificuldades, de forma que soluções criativas também nascem do empenho dos pesquisadores.

Vale ainda lembrar que os estudos a respeito da inclusão nas escolas foi uma das áreas recentes de pesquisa que se fortaleceu por conta da troca entre academia e sociedade. Junto com ela, as discussões sobre a tolerância e a educação para a diversidade permearam muitas dissertações de mestrado e teses de doutorado defendidas nos últimos anos. Ainda recentemente, paralelamente à questão da inclusão, os debates em torno da relação escola-família também vêm se aprofundando. “A sociedade mostra suas fragilidades e os cursos de pós-graduação estabelecem as reflexões. Por conta disso, entender, perceber as contradições e as dificuldades e propor intervenções na ligação entre família e escola tem se tornado uma questão central de pesquisa”, explica Wanda. “A inclusão social, econômica, digital e de portadores de deficiências tem a ver com isso, assim como as questões da disciplina, da violência e da relação professor-aluno”.

Sobre o futuro, os dois coordenadores são cautelosos, mas arriscam dizer que durante algum tempo essas ditas questões emergentes permanecerão na linha de frente do interesse dos pesquisadores, sem contudo apagar ou suplantar as outras questões clássicas que sempre marcaram as dissertações e mestrados em educação, como a avaliação, a disciplina, a relação ensino/aprendizagem, as correntes pedagógicas. “Os cursos estão sempre abertos e dispostos a responder às novas demandas”, garantem os dois coordenadores.

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