Deputado, qual a sua avaliação sobre o Estatuto do Desarmamento e seu processo de aprovação?
Luis Eduardo Greenhalg – O Estatuto do Desarmamento é um conjunto de propostas que pretende restringir ao máximo a posse de armas de fogo no país. A lei proíbe a venda de armas de fogo para particulares, ficando permitido o porte apenas para integrantes das Forças Armadas, policiais, seguranças e para quem mais comprovar necessidade. Além disso, para ter a posse, o cidadão deve ter mais de 25 anos e comprovar idoneidade, que tem trabalho fixo, residência conhecida e condições técnicas e psicológicas para manusear uma arma. Reclamam que esse projeto vai desarmar a população honesta. Mas quem desarma o cidadão de bem é o bandido, que além da arma e dos bens, leva a vida da pessoa.Também estamos atacando o comércio de armas clandestinas e desarmando o uso ilegal. O porte ilegal passa a ser crime inafiançável. Hoje, se você for pego com uma arma clandestina, paga lá a fiança e vai embora. Agora passa a ser crime inafiançável. E mais, se for porte de arma de uso restrito das Forças Armadas, além de inafiançável, o acusado perde o direito de responder em liberdade. Só assim já vamos diminuir o número de armas clandestinas em circulação. Para coibir o mercado clandestino, vamos ter regras rígidas para o comércio de armas de fogo. Vamos dar responsabilidades ao fabricante. Ele terá de fazer a impressão digital da arma, registrando as ranhuras dos projéteis, vai numerar e avisar à Polícia Federal onde a arma será comercializada. O dono da loja não poderá vender para qualquer pessoa, só para autorizados pelo Sistema Nacional de Armas e Munição. E esse projeto é avançado porque propõe ainda que as pessoas possam entregar suas armas e serem ressarcidas por isso. Nunca se propôs isso antes.
Como foi o trabalho de compilar as mais de 70 propostas relativas ao desarmamento que tramitavam no Congresso? Quais foram os critérios de seleção?
LEG – Durante 15 dias eu li e fui construindo um estatuto em cima das melhores propostas . Então fui separando por temas e ficou: posse, porte, registro, entrega voluntária e assim por diante. Foi trabalhoso, mas não foi difícil.
No estatuto pronto, quem foi contemplado e quem foi preterido?
LEG – Ficou no documento final o que havia de melhor. Então, armas de brinquedo, por exemplo. Não é possível distinguir uma arma de brinquedo de uma arma de verdade. Então fica proibido o comércio desses brinquedos. E o que vai ser preterido é a população quem vai decidir no plebiscito proposto para 2005. Estamos tentando preterir a violência e salvar vidas.
Quais são os dados e os argumentos que o senhor usou para chegar a esse documento final?
LEG – O Estatuto do Desarmamento pretende restringir ao máximo a posse de armas de fogo. E por quê? Por que temos os seguintes números: de cada 10 homicídios, 7 são por armas de fogo. De cada 100 crimes cometidos com armas de fogo, só 5 são com armas registradas. E a vítima é um jovem, da periferia, que tem entre 16 e 24 anos. E quem é o atirador? O atirador tem o mesmo perfil da vítima. É também um jovem, da periferia, de 16 a 24 anos. Assim chegamos num paradoxo. A população que mata é igual à população que morre, e que é a nossa juventude. É claro que o Estatuto sozinho não salvará a vida dos jovens. Há outras razões para a violência, como falta de dinheiro, habitação e desestrutura familiar. Investir nessas áreas é também uma solução a longo prazo. Mas precisávamos de uma medida para o agora. Diminuir o número de armas em circulação é fundamental. Veja que em São Paulo, no ano passado, foram concedidas 1.180 autorizações para porte de armas. E a polícia diz que, só na capital, temos 1,5 milhão de armas clandestinas.
Mas estamos falando em diminuir o número de armas legais e não das ilegais. Como restringir então as clandestinas?
LEG – Em primeiro lugar, e isso é inédito e audacioso, estamos propondo a entrega voluntária de armas, mediante pagamento. Então a pessoa que tiver uma arma clandestina pode ir lá na Polícia Federal, entregar sua arma e receber uma indenização. Com isso, estamos querendo que o menino da favela possa ter uma opção. Em vez de entregar a arma a um traficante, leva na polícia e recebe mais do que o marginal pagaria. Porque ele precisa ganhar mais para entregar sua arma na polícia. E também vamos fechar a possibilidade de contrabando, fechando as fronteiras. Porque hoje armas legais são produzidas no Brasil, exportadas para o Paraguai e voltam para o Brasil por contrabando, virando armas ilegais.
Como o governo pretende sensibilizar as pessoas para a entrega das armas?
LEG – Vamos fazer campanhas e mutirões de dois em dois meses. Vamos ter direito à propaganda oficial.
De onde está previsto que saia o dinheiro para pagar as indenizações?
LEG – Do Sistema Nacional de Armas e Munição.
E a quem caberá a fiscalização da entrega, do pagamento e da destinação dessas armas?
LEG – À Polícia Federal. Sempre à Polícia Federal.
E como fazer para que as armas compradas legalmente não vazem para os marginais?
LEG – Essa é nossa maior dificuldade. As armas de cidadãos honestos, são armas honestas, legais, que, em geral, só passam para as mãos do bandido num assalto. Diminuindo o número de armas de particulares, diminui também esse vazamento em assaltos. Além disso, o enrijecimento da pena para porte ilegal deve coibir um pouco essa ação.
E no caso da polícia? Infelizmente é conhecida a relação corrupta entre policiais e ladrões...
LEG – Com fiscalização da Polícia Federal.
O projeto já foi aprovado no Senado, o próximo passo é a votação na Câmara dos Deputados. O que o senhor espera para essa próxima etapa?
LEG – O projeto já foi aprovado na Comissão Mista e no Senado. Na Câmara é mais difícil, porque lá atuam os lobbies, mas pretendemos vencer mais essa etapa discutindo aqueles números absurdos. Provando que armas de fogo tiram a vida da nossa juventude.
Em 1997, a Inglaterra aprovou um projeto semelhante ao estatuto do desarmamento, mas depois de 5 anos o número de crimes dobrou. Qual o risco de estarmos caminhando para o mesmo destino?
LEG – É engraçado, muita gente me fala desses dados. Não só você, mas em outras entrevistas também. Os dados que eu tenho, no entanto, mostram que a Inglaterra aprovou um projeto, na minha opinião inferior ao nosso, que já diminuiu em 54,9% o número de mortes causadas por armas de fogo. Repito: 54,9%.