SINPRO- SP oferece curso sobre a história da cidade a partir de suas obras religiosas
(*) Por Elisa Marconi e Francisco Bicudo
Tem nome de santo, nasceu de um colégio religioso, mas grande parte de suas Igrejas, que poderiam servir de testemunhas da história e da cultura da cidade, infelizmente está mal conservada. São Paulo tem cerca de 480 templos católicos, alguns construídos ainda nos primeiros tempos de formação da cidade. Outros são bem mais recentes. Novos ou antigos, o fato é que um olhar mais atento direcionado a esses prédios, suas construções, suas reformas e suas imagens pode revelar detalhes importantes da trajetória social, cultural e urbana da metrópole.
Partindo dessa idéia é que os mestres em Artes, Maria José Spiteri Tavolaro Passos e Mozart Alberto Bonazzi da Costa, organizaram o curso “São Paulo 450 anos: a história e a arte em suas igrejas”. “É para quem quer conhecer melhor as construções religiosas históricas de São Paulo”, explica o professor Mozart. Ele completa: “Vamos falar sobre os aspectos estilísticos e técnicos do período colonial, na arquitetura, pintura, talha e na simbologia dos monumentos”.
Será uma verdadeira viagem no tempo. Enquanto as imagens das igrejas e de seus patrimônios estiverem sendo projetadas, músicas daquela época, de compositores da cidade, convidarão os alunos participantes do curso a descobrir a São Paulo colonial. “Os representantes mais antigos de igrejas e imagens que temos no Brasil estão aqui, no estado de São Paulo”, explica o idealizador da proposta, referindo-se à Capela de Santo Antônio, em São Roque, e à Igreja de Nossa Senhora da Conceição, de Voturuna, que têm inspiração na transição da Renascença para o Barroco. Já na cidade de São Paulo, a instalação dos templos não foi tão simples assim. O problema começa com a localização da Vila de São Paulo. “Escondida” no alto da Serra do Mar – conhecida como “A Muralha” – a região era de difícil acesso. Longe do mar e dos portos, os materiais de construção, as imagens e os ornamentos não chegavam aqui tão facilmente, como acontecia em Salvador, por exemplo.
Apesar da barreira geográfica, os Jesuítas, Franciscanos e Beneditinos conseguem subir as encostas e se instalar na vila. Junto com eles, vêm as edificações religiosas, colégios, arruamentos, casas, enfim, a cidade. Nossos colonizadores religiosos eram detentores de grandes conhecimentos técnicos, por isso algumas das construções que vemos hoje são herança daquele tempo e dos missionários. Da obra dos Beneditinos, temos ainda hoje o Mosteiro de São Bento, o Colégio São Bento e, como em qualquer lugar do mundo onde os esses freis atuam, enormes bibliotecas. Os Franciscanos, além do largo com o nome do padroeiro da ordem, construíram o prédio da Faculdade de Direito do Largo São Francisco (de 1828) e as duas igrejas adjacentes – São Francisco de Assis e Ordem 3a de São Francisco. Aliás, essa última é carinhosa chamada pelo professor Mozart de “jóia das jóias”, porque ela tem uma preciosidade única. “Ela é o que restou de intacto e original na cidade de São Paulo. Suas construções datam de 1730 e 1780, nenhuma outra igreja é desse tempo”, afirma. Além disso, a Ordem 3a foi projetada pelo famoso Frei Galvão, uma espécie de milagreiro popular na capital; às suas pílulas – bolinhas de papel com uma oração e cola – se destinam graças.
A análise de Mozart Bonazzi da Costa é reveladora da característica mais cruel das construções religiosas paulistanas. “Quase tudo foi destruído, ou reconstruído”, explica. Por isso a igreja do Largo São Francisco é preciosa, porque é original. A Catedral da Sé, o Mosteiro de São Bento, o Pátio do Colégio e a Igreja do Carmo, por exemplo, foram reerguidos em cima das ruínas dos prédios originais. Das construções dos jesuítas, para não dizer que nada restou, há ainda um pedaço de parede do antigo Colégio São Paulo, no Páteo do Colégio. E só. É verdade que os jesuítas sofreram uma forte perseguição e foram expulsos do país em 1759. A Ordem de Jesus estava fortemente estabelecida no Brasil e a Coroa Portuguesa tinha muito receio de que as comunidades lideradas pelos jesuítas se separassem e formassem um país independente, maior que o estado do Mato Grosso. A perseguição se transformou em expulsão dos missionários. As obras deles foram também destruídas, para não deixar rastros, vestígios ou inspirações.
Em São Paulo não foi diferente e, por isso, quase nada nos resta dos primeiros colonizadores da Vila de São Paulo. Mas, ainda mais grave que a falta de um legado físico jesuíta é o estrago social que isso causou, como sugere o entrevistado: “O problema é sério, porque repercute uma visão imediatista, muito forte no Brasil e em São Paulo. A falta de parâmetros visíveis do nosso passado nos faz um povo meio sem referências”. É uma máxima bem conhecida: quem não conhece o passado, não o preserva.
E a falta de preservação de nosso patrimônio histórico e cultural é outra característica bem marcante que os alunos do curso “São Paulo 450 anos: a história e a arte em suas igrejas” vão perceber sem dificuldades. Muitas reformas, pinturas e retoques nas imagens foram feitas sem seguir nenhum padrão. Na capela de Santo Antônio, na Praça do Patriarca, por exemplo, um dos altares foi pintado com tinta acrílica, que é extremamente agressiva à madeira. Para tirar a pintura, acaba-se deteriorando o material original. E o professor Mozart explica que não é por mal que essas intervenções são feitas: “Em geral, é a comunidade quem interfere nas obras, com o intuito de manter, de deixar bonito, mas a falta de conhecimento apropriado de preservação acaba danificando o patrimônio”.
E tem solução? Segundo Maria José e Mozart, tem sim. E a saída para o problema mora exatamente onde ele nasce. Ou seja: basta conscientizar a comunidade que freqüenta a igreja sobre o valor histórico que cada edifício, talha, ou imagem tem, para que as peças fiquem preservadas. Claro que a reconstrução ou a restauração são atividades altamente especializadas, mas o cuidado para que os templos e seus patrimônios não se estraguem – como não pintar aleatoriamente, não usar produtos abrasivos nas imagens - podem ser do conhecimento da população e isso certamente ajudará a manter viva a peça, mas também a História.
Outra forma de contribuir para que nosso passado não se apague e para que ele seja valorizado como merece, é, como não podia deixar de ser, fazer o curso “São Paulo 450 anos: a história e a arte em suas igrejas”. O SINPRO-SP abrirá as portas para essa viagem no tempo nos dias 21 e 28 de maio; no dia 29, sábado, os viajantes aterrissam nas igrejas estudadas, para um trabalho de campo e de observação. Mais informações pelo telefone 5080-5988.
Curso
São Paulo 450 anos: a história e a arte em suas igrejas
Professores: Mozart Alberto Bonazzi da Costa e Maria José Spiteri Tavolaro Passos
Público-alvo: professores de história, artes, literatura, turismo, arquitetura e demais interessados.
Conhecer algumas das mais importantes construções históricas de uso religioso presentes na região central da cidade de São Paulo; identificar os aspectos estilísticos e técnicos do período colonial brasileiro presentes na arquitetura, pintura, talha e imaginária dos monumentos visitados, refletir sobre a formação cultural da cidade através da visita a monumentos históricos.
Inscrições:
Sindicalizados: R$ 55,00 ou 2 x R$ 27,50
Não-sindicalizados: R$ 75,00 ou 2 x R$ 37,50
Datas: 21, 28 e 29 de maio
21 e 28 de maio (sextas-feiras, das 19h às 22h) e 29 de maio (sábado, das 9h às 15h)
Carga horária: 12 horas
Mozart Alberto Bonazzi da Costa é mestre em artes visuais pelo Instituto de Artes da Unesp. Vem se dedicando à pesquisa de processos escultóricos tradicionais, sobretudo aqueles aplicados na talha barroca e rococó. Maria José Spiteri Tavolaro Passos é mestre em artes visuais pelo instituto de artes da Unesp Plásticas. Pesquisadora, vem se dedicando ao estudo da arte no período colonial brasileiro, atuando também como formadora de educadores para a atuação junto a museus e espaços culturais
Dia 29, sábado, prática de campo.