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Síndrome de Burnout e os professores

Por Francisco Bicudo e Elisa Marconi

O estresse tornou-se intenso, crônico, e o professor sente-se permanentemente cansado, sem motivação. Irrita-se com facilidade, está sem paciência. Não consegue mais ver significado no trabalho que desenvolve e acredita que não tem mais competência para lecionar – “minhas aulas estão horríveis”, pensa –; por isso, falta com freqüência. Deixou de ir a cinemas, teatros, não viaja. Há tempos deixou de procurar os amigos. Não, não se trata apenas de depressão profunda. Esse professor – aqui fictício, mas capaz de representar situação vivida por grande parte da categoria – sofre da Síndrome do Desgaste Profissional, ou simplesmente Síndrome de Burnout. O nome popular não foi atribuído por acaso – pode ser traduzido como “aquilo que deixou de funcionar”.

“É uma situação complicadíssima, pois o educador não suporta mais seu trabalho, mas não tem como abandoná-lo”, afirma a psicóloga e pedagoga Beatriz di Marco Giacon. De acordo com Jorge Castellá Sarriera, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), o esgotamento é total, e torna-se impossível manter o equilíbrio pessoal. O cenário é mais grave do que se imagina: estudo desenvolvido em 1999 por Wanderley Codo, pesquisador do Laboratório de Psicologia do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB), revelou que, dos 39 mil docentes avaliados, de diferentes estados do país, aproximadamente 50% sofria, em maior ou menor grau, da Síndrome. “É uma doença funcional, diretamente ligada à profissão, ao ambiente de trabalho, embora não exista conscientização sobre isso”, completa Beatriz, que é também professora da PUC/SP e do Senac.

Causas do problema
Não é difícil imaginar, assim, quais as causas do problema. O acúmulo de atividades, a burocratização do trabalho, as planilhas e relatórios que deve preencher, as tarefas cumpridas em casa – à noite, durante os finais de semana –, as horas gastas no trânsito para correr de uma escola para outra não deixam sobrar tempo para o professor preparar suas aulas. Ele sente que está deixando de cumprir sua missão com qualidade e competência. Apesar do esforço para dar conta de toda essa carga extra de trabalho, o educador vê a sua profissão cada vez menos reconhecida pela sociedade. Não raro, é surpreendido por alunos que perguntam “o senhor também trabalha ou só dar aulas?”, como se a tarefa de educar fosse apenas um bico, algo de menor importância.

As constantes mudanças nos conteúdos curriculares geram angústias. Afinal, qual o aluno que desejamos formar? Para que estamos educando? Os conflitos – salas superlotadas, estudantes indisciplinados e dispostos a afrontar –, as pressões sofridas no ambiente de trabalho – dos alunos, dos pais, dos coordenadores, dos diretores – e o conflito de papéis que devem ser desempenhados – professor, pesquisador, conselheiro, administrador – geram um desgaste emocional que se acumula. “Some-se a isso tudo a chamada crise da pós-modernidade, que conduz à ausência de projetos, a ausência de sonhos e de expectativas”, reforça Beatriz. “Estamos constantemente oscilando, em uma tensão constante, entre forças de saúde e de doença. Mas, quando não sabemos lidar com o estresse, podemos sucumbir”, alerta Sarriera. Ele completa: “Quando a luta é inglória e o estresse torna-se crônico, pode desembocar na síndrome e provocar a manifestação de uma série de doenças”.

Professor, alvo preferencial
A Síndrome, explicam os pesquisadores, não se restringe apenas aos professores – embora estes sejam um dos alvos preferenciais –, mas ataca todos os profissionais que são responsáveis por cuidar de outras pessoas, como médicos, psicólogos e policiais. No caso dos docentes, Beatriz acredita que a doença atinja mais intensamente aqueles que atuam na educação básica e no ensino médio. “O professor universitário ainda desperta um certo respeito e acaba sendo mais valorizado”, avalia. Ela diz que é preciso ficar atento a alguns sinais específicos e bastante característicos, já que o problema é gradual, e não se manifesta repentinamente.

De olho nos sinais

• Em um primeiro estágio, o principal elemento é o cansaço emocional. O professor reclama muito e já acorda esgotado – a segunda-feira é um terror. Os relacionamentos tornam-se complicados e ficam prejudicados, e o docente parece “carregar o mundo nas costas”;

• o segundo momento é o da despersonalização. Vêm à tona sentimentos como impotência, fragilidade e desesperança. Não há mais preocupação com o que as pessoas próximas estão sentindo. O processo de aprendizagem torna-se inviável, pois o professor não consegue mais desempenhar suas funções;

• no terceiro e mais avançado grau de manifestação da doença, o do abandono, o educador deixa de acreditar e de investir nele mesmo, desvalorizando sua própria imagem. As dificuldades atingem os relacionamentos familiares. Há um sentimento ainda maior de incompetência, que leva a um retrocesso profissional, à perda de idéias e ao auto-isolamento;

• durante o avanço da doença, diabetes, dores de cabeça e nas costas, depressão, tiques, insônia, pressão alta, gastrites e úlceras e doenças cardíacas são outros dos problemas que podem aparecer.

Em um primeiro estágio, o principal elemento é o cansaço emocional. O professor reclama muito e já acorda esgotado – a segunda-feira é um terror. Os relacionamentos tornam-se complicados e ficam prejudicados, e o docente parece “carregar o mundo nas costas”, como define Beatriz. O segundo momento é o da despersonalização. Vêm à tona sentimentos como impotência, fragilidade e desesperança. Não há mais preocupação com o que as pessoas próximas estão sentindo. O processo de aprendizagem torna-se inviável, pois o professor não consegue mais desempenhar suas funções. No terceiro e mais avançado grau de manifestação da doença, o do abandono, o educador deixa de acreditar e de investir nele mesmo, desvalorizando sua própria imagem. As dificuldades atingem os relacionamentos familiares. Há um sentimento ainda maior de incompetência, que leva a um retrocesso profissional, à perda de idéias e ao auto-isolamento. Durante o avanço da doença, diabetes, dores de cabeça e nas costas, depressão, tiques, insônia, pressão alta, gastrites e úlceras e doenças cardíacas são outros dos problemas que podem aparecer.

É preciso conhecer a doença
Beatriz acredita que o primeiro passo para a superação da doença é a popularização das informações – o professor precisa conhecer a doença, perceber as mudanças de humor e de comportamento e aceitar que alguma coisa não está bem. Segundo ela, os sindicatos têm uma função primordial na divulgação da Síndrome e na conscientização a respeito dos cuidados que devem ser adotados. Durante o curso “Síndrome de Burnout em Professores”, que acontecerá no SINPRO-SP nos dias 16 e 23 de março (quartas-feiras), das 19h às 22h, a psicóloga e pedagoga pretende, além de esclarecer o que é a doença, reforçar a idéia de que se trata de um problema funcional e discutir com os docentes possíveis estratégias para enfrentá-lo. “A atividade docente será sempre conflituosa, não tem jeito. O professor precisa desenvolver mecanismos para resistir a essa situação. Durante o curso, pretendemos trabalhar técnicas de relaxamento e de autoconhecimento, dentre outros elementos”, explica.

A responsabilidade da escola também não pode ser esquecida. “É preciso transformá-la em um ambiente saudável”, pede Sarriela. Wanderley Codo pensa de maneira semelhante: “Os professores devem ter em mente que a Síndrome é um problema individual, decorrente do trabalho, e por isso deve ser resolvido na própria escola. A criação de um projeto de valorização do magistério é o único método eficiente de combate à doença”, afirma, em entrevista ao site da revista Nova Escola.

O curso organizado por Beatriz é apenas uma das iniciativas e estratégias idealizadas pelo Sindicato para garantir à categoria a possibilidade de discutir, conhecer melhor e combater o estresse profissional – que não se restringe à Síndrome de Burnout e pode se manifestar de outras formas. O SINPRO-SP acaba de acertar uma parceria com a terapeuta ocupacional Daniela Cristina dos Santos, do Laboratório de Saúde Mental da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A idéia é desenvolver uma pesquisa acadêmica sobre diferentes problemas de estresse dos professores de escolas particulares da cidade de São Paulo. Segundo a pesquisadora, será um estudo sobre saúde mental no trabalho. Os objetivos principais são detectar os níveis do estresse ocupacional e avaliar se os professores consideram que os esforços e investimentos que fazem para desenvolver suas atividades estão sendo recompensados. A partir dos resultados, a intenção é apontar possibilidades de intervenção, na área de terapia ocupacional, que possam auxiliar o professor a superar essas dificuldades.

A idéia do estudo surgiu a partir das experiências práticas vividas por Daniela, também formada no magistério. São três as principais lembranças que ela guarda do tempo que trabalhou como professora da educação infantil, na cidade de São Carlos, interior de São Paulo: os pedidos de demissão e de licença médica; as queixas sobre a falta de tempo para desempenhar outras atividades e o cansaço extremo; e a impaciência que as professoras manifestavam com seus próprios filhos. “Quando terminei a graduação, comecei a pesquisar mais sobre o trabalho e a saúde dos professores”, completa.

Para ela, o cenário na educação infantil é preocupante. Apesar do cansaço mental e do desgaste emocional, as professoras tendem a se esforçar para buscar um padrão de atendimento de qualidade, para não prejudicar os alunos. “Elas gostam de seus alunos, gostam da docência”. Mas, não raro, acabam se vendo impotentes diante de problemas como mobiliário inadequado, excesso de barulho e de atividades, baixos salários, indisciplina e classes superlotadas. As conseqüências não são animadoras: as professoras se queixam de tensão muscular, ansiedade, dores nas costas, cansaço mental, dor de garganta, insônia, dificuldade de concentração, perda de auto-estima e sentem-se impotentes para enfrentar os problemas diários. A saída, segundo Daniela, está em dar visibilidade a essa situação, procurando ampliar a produção acadêmica na área e a publicação de reportagens e artigos sobre o tema. Além disso, a terapeuta ocupacional acredita que devem estruturados programas de saúde no trabalho, que possam chegar às escolas e envolver equipes multidisciplinares.

“É preciso encontrar parceiros e pesquisadores sonhadores e idealistas, pois esse é um trabalho muito difícil”, conclui.

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