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A estratégia militar do governo de Ariel Sharon

Por Elisa Marconi e Francisco Bicudo

As imagens da desocupação israelense da Faixa de Gaza espalharam-se pelo mundo e foram repetidas à exaustão: colonos radicais judeus entrincheirados em suas casas e em sinagogas, recusando-se a sair, tiveram de ser arrastados e carregados por soldados do Exército israelense. Chegava ao fim uma história de 37 anos de ocupação, já que Israel anexara Gaza ao seu território durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, quando, mais uma vez, derrotou os árabes. A comunidade internacional e a mídia comemoraram: o governo do primeiro-ministro Ariel Sharon havia dado um passo significativo em direção à concretização da paz na região.

As peças do quebra-cabeças, no entanto, não se encaixavam e pelo menos uma dúvida pairava no ar: teria Sharon, sempre conhecido por sua truculência e intransigência no trato com a questão palestina, transformado-se em um adepto do processo de paz? Quais seriam as motivações dessa profunda mudança de comportamento político? “Sharon não mudou de lado e muito menos defende a paz. A retirada israelense da Faixa de Gaza faz parte de um plano militar unilateral, que pretende definir à força, e sem consultar os palestinos, as fronteiras de Israel, interessada apenas em proteger sua própria população. Está longe de representar qualquer processo de paz, até porque desconsidera abertamente a possibilidade de assinatura de qualquer acordo”, garante Demetrio Magnoli, professor de Geografia Humana, especialista em relações internacionais e articulista do jornal “Folha de S. Paulo”.

Estratégia militar
A estratégia militar é colocada em prática com base em cálculos e análises pragmáticas: Israel já percebeu que o crescimento populacional palestino na região é muito mais rápido do que o aumento da população judaica, que, em breve, seria uma minoria evidente. Essa “bomba demográfica” poderia oferecer aos palestinos uma vantagem quantitativa considerável. Essa ameaça, somada à morte de Iasser Arafat (sempre visto como um obstáculo) e à pouca disposição do governo Sharon para o diálogo, estabeleceram um grande consenso interno em Israel: era preciso agir rápido, de maneira incisiva, para garantir as fronteiras e a sobrevivência do país. Segundo Magnoli, o próximo passo do plano militar se dará na Cisjordânia. “Lá, Israel pretende desocupar algumas colônias judaicas isoladas, sem muita importância, e incorporar a maior parte delas. Depois, deve concluir a construção do muro da vergonha, já condenado inclusive pela comunidade internacional, que pretende separar a Cisjordânia israelense e segregar os territórios palestinos. Dessa forma, o governo Sharon terá estabelecido os limites de seu território, a leste e a oeste”.

Para os palestinos, as conseqüências desse processo serão dramáticas: terão “direito” a um território fragmentado, formado por bolsões sem comunicação ou proximidade, por áreas não contínuas, que não corresponderiam à partilha feita em 1947, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) dividiu a antiga Palestina entre árabes e israelenses, e que também sequer se aproximariam dos desenhos traçados pelas tentativas de estabelecer a paz, durante os anos 1990. “Seria um arremedo de Estado”, define Magnoli. Os palestinos estão dispostos a aceitar essas imposições? O especialista diz que, depois da morte de Arafat, as lideranças que assumiram a Autoridade Nacional Palestina são muito moderadas, e procuram se estabelecer e controlar suas divergências internas a partir de laços de apoio construídos com os Estados Unidos. Essas relações seriam ainda responsáveis por garantir ajuda externa para a estruturação do aparelho estatal e institucional palestino. Diante desse cenário, e mesmo que adote uma retórica anti-Israel, Magnoli afirma que a ANP tem concordado com os ultimatos e os planos unilaterais do governo Sharon, e a tendência é que aceite a formação de um Estado palestino que siga os traçados desejados por Israel.

Magnoli, no entanto, faz um alerta: essa imposição não é aceita pela maior parte dos palestinos, que exigem a devolução de 100% da Cisjordânia, e que pretendem fazer de Jerusalém a futura capital palestina. Para ele, há divergências e choques evidentes, cada vez mais intensos, entre a Autoridade Palestina e a população palestina, provocando um fortalecimento dos grupos religiosos extremistas, como o Hammas. “Vale lembrar que o Hammas avançou bastante nas últimas eleições municipais e se prepara para a disputa legislativa. Com esse avanço, a legitimidade da liderança palestina fica no mínimo questionada. Ela perde credibilidade política”. Não por acaso, o grupo extremista, logo após a desocupação de Gaza, apressou-se em fazer uma convocação à resistência armada, pois teria sido essa a forma de luta responsável pela saída israelense da região. Para não perder espaço político, a ANP também teve de comemorar, apresentando o novo território como se fosse uma conquista de sua postura conciliadora e moderada.

Na outra ponta, Magnoli acredita que Sharon já conseguiu vencer as resistências impostas pelos colonos radicais judeus. Ele admite: as cenas de soldados carregando colonos vão se repetir quando a Cisjordânia, pontualmente, for desocupada. De fato, há quem considere Sharon um traidor. Mas, na opinião do especialista, são vozes marginais e periféricas, isoladas. “Sharon conseguiu construir uma ampla aliança, sólidas bases de apoio, que envolvem o seu partido, o Likud, e até mesmo a maioria parlamentar do Partido Trabalhista”. Os questionamentos e críticas a esse processo militar vêm da ala esquerda dos trabalhistas, minoritária, e de pequenos partidos de esquerda, independentes. Eles defendem a continuidade das negociações e um tratado de paz definitivo assinado com os palestinos, capaz de estabelecer inclusive um acordo sobre Jerusalém, que se transformaria na capital dos dois Estados.

Diante das pretensões unilaterais do governo Sharon e das tensões entre Autoridade e sociedade palestinas, a possibilidade de paz na região transforma-se em uma hipótese cada vez mais distante e remota. Um cenário bem diferente daquele que foi apresentado e comemorado pelo noticiário internacional. “Esse foi um discurso construído em Washington, pelo governo Sharon, incorporado pela própria Autoridade Palestina e repercutido pela mídia. Mas trata-se apenas de uma narrativa construída por um dos lados da disputa”, conclui.

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