envie por email 

Depoimento de Roberto Leal Lobo e Silva Filho*

“A sugestão que está sendo encaminhada e que começa a ser debatida com as universidades federais não representa o fim do vestibular, mas tem como intuito permitir que, no setor federal, o estudante dispute vagas em diferentes instituições, a partir de uma única avaliação. Para tanto, o ENEM passaria por modificações, aumentando o número de questões, incorporando o conteúdo cobrado pelos atuais vestibulares, além de exigir e articular habilidades e capacidade de raciocínio. Creio que a proposta possa ser útil do ponto de vista da avaliação da formação do estudante de nivel médio e pela repercussão na orientação das escolas que atuam neste nivel de ensino, mas continua sendo vestibular, feito como agora, em uma ocasião única. É quase uma questão semântica. Será um grande processo seletivo unificado, que estabelece classificações, e as pressões e cobranças sobre os alunos também permanecem. E, nesse sentido, a avaliação segue se resumindo à etapa em que o aluno está terminando o ensino médio. Eu sempre me manifestei favorável a um processo contínuo, um exame de acompanhamento que fosse realizado ao final do primeiro ano, do segundo ano e do terceiro ano, justamente para que se pudesse ter noção mais precisa da evolução, do amadurecimento, do aprendizado. Mas entendo que essa dinâmica exige engenharias complexas, incluindo os custos.

Acredito que algumas expectativas que estão sendo anunciadas pelo MEC são utópicas, não vejo muita condição de se concretizarem na prática. A questão da múltipla escolha de cursos como forma de preencher vagas ociosas é uma delas. Se em determinada localidade temos oferta para uma carreira, mas um mercado de trabalho já saturado, é muito difícil que um aluno de uma região distante queira se deslocar para lá, sem a perspectiva de emprego no futuro, até porque essa formação exigiria investimentos altos em transporte e alojamento, por exemplo. Além disso, a experiência mostra que escolhas de segunda opção geram altos índices de evasão. Há que se pensar também sobre a unificação dos conteúdos, pois teríamos um exame de caráter nacional, que cobraria do aluno uma visão geral sobre as disciplinas, talvez desconsiderando especificidades regionais. De acordo com o MEC, parece que vai se permitir que cada universidade federal, se assim o desejar, organize um exame de segunda fase, o que poderia minimizar esse problema. O mais complicado, creio, é que o ENEM se transformará oficialmente no exame nacional de aferição do conhecimento do aluno egresso do ensino médio. E se, por exemplo, um estudante tirar zero no exame? Deveria ter direito ao diploma de ensino médio? O que fazer com a instituição que formou esse aluno? Vai ser punida? Vai ser fechada? Depois da avaliação, ao analisar os resultados, o MEC certamente terá de tomar alguma providência, o que significa um problema extra.

Sobre a possível unificação da primeira fase dos vestibulares das universidades estaduais paulistas, trata-se de uma idéia antiga. Não vejo problema algum, sou favorável. Ajuda a evitar as coincidências de datas, os exames seguidos, as semanas de tensão e de rotinas estafantes para os vestibulandos. Além disso, pode ajudar a combater as matrículas simultâneas em duas instituições, sendo que uma delas depois acaba sendo cancelada, o que obriga a universidade a organizar as listas de segunda chamada, cenários que costumam atrasar o início do ano letivo.

Não sei se esses movimentos poderão gerar impactos e repercussões para as instituições particulares. Na minha opinião, pensar em unificação nesse segmento é algo inviável, pois a competição é bastante acirrada, e uma avaliação única poderia gerar desequilíbrios significativos nessa balança. Creio que a tendência seja a manutenção do modelo atual, onde cada uma organiza o seu processo seletivo com os respectivos critérios.

Confesso que o que muitas vezes me assusta é que parece que olhamos muito para o ensino superior e muito pouco para o fundamental. O problema da educação no Brasil de fato não está no processo seletivo, até porque cerca de 70% dos alunos que cursam escolas públicas não chegam a terminar o ensino médio, ou seja, não fazem vestibular. É preciso mexer lá na base. Desde muito cedo, nosso aluno é adestrado, não estimulado a raciocinar. Esse seria o grande salto, a revolução da nossa educação. Nosso sistema de ensino é extremamente adestrador, os estudantes são obrigados a anotar e fazer provas. Ele absorve mecanicamente os conteúdos e os devolve nas avaliações. Os conceitos passam dos ouvidos para as mãos, sem que sejam processados pelo cérebro. É uma decoreba mecanicista. Nossos alunos não são desafiados a pensar, a relacionar, a sistematizar conhecimentos, a encontrar soluções originais para os problemas, não se comunicam ou mantêm intercâmbio com colegas de outras instituições. São alunos movidos pelo medo das provas, não pela beleza da curiosidade.”

*Ex-reitor da USP e atual presidente do Instituto Lobo e diretor da Lobo & Associados Consultoria

Leia também
O debate sobre os vestibulares


ver todas as anteriores
| 03.02.12
De onde viemos

| 11.11.11
As violências na escola

| 18.10.11
Mini-Web

| 30.09.11
Outras Brasílias

 

Atualize seus dados no SinproSP
Logo Twitter Logo SoundCloud Logo YouTube Logo Facebook
Plano de saúde para professores
Cadastre-se e fique por dentro de tudo o que acontece no SINPRO-SP.
 
Sindicato dos Professores de São Paulo
Rua Borges Lagoa, 208, Vila Clementino, São Paulo, SP – CEP 04038-000
Tel.: (11) 5080-5988 - Fax: (11) 5080-5985
Websindical - Sistema de recolhimentos