Por Francisco Bicudo
A epidemia de gripe provocada pelo vírus H1N1 – popularmente conhecida como gripe suína – que chegou ao Brasil certamente exige cuidados e atuação responsável e decidida das autoridades de saúde pública, para orientar e informar a população sobre o problema e para sistematizar medidas eficientes de prevenção e combate à doença. Não há como negar que o cenário é delicado e grave, principalmente porque se trata de um vírus novo, resultado da mistura de três espécies diferentes (suína, aviária e humana) e ainda pouco conhecida dos cientistas, o que significa dizer que também não se sabe com precisão como o vírus age e quais os malefícios que pode causar. Seria tolice querer brigar com os fatos. É preciso serenidade e equilíbrio para poder enfrentar com qualidade e competência o cenário adverso.
No entanto, como as manchetes sobre o assunto são diárias (e às vezes resvalam em exageros), assim como o anúncio e a contagem de novas mortes, e graças à velocidade com que as informações se espalham, o pânico parece ter se alastrado pelo país como rastilho de pólvora. É uma percepção que os números, ao menos até agora, não justificam. Até o dia 29 de julho, 61 pessoas tinham morrido por conta do H1N1 no Brasil – no ano passado, segundo dados do Ministério da Saúde, a gripe convencional fez mais de 70 mil vítimas fatais no país. Números da Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgados em 30 de julho registravam 165 mortes na Argentina, 138 no México e 79 no Chile, outros focos da doença, por conta do H1N1. A própria OMS reconhece que a pandemia de gripe suína continua sendo “moderada e, na grande maioria dos casos, as pessoas infectadas apresentam sintomas leves e que são semelhantes aos de qualquer outro tipo de gripe”, como informa matéria veiculada pelo portal estadao.com
Um dos momentos recentes de ápice dessa narrativa aconteceu no último dia 28 de julho, quando a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo seguiu orientação da Secretaria de Saúde e decidiu adiar em quinze dias (para 17 de agosto) o início do semestre letivo na rede estadual de ensino. “O governo do Estado tomou esta decisão para tentar reduzir a transmissão do vírus influenza A H1N1”, diz nota oficial divulgada pela Secretaria de Educação em seu site.
A decisão disparou um movimento em cascata e acabou por consolidar uma tendência, tendo sido imediatamente seguida pela rede municipal de São Paulo, pelas três universidades públicas do estado (USP, Unesp e Unicamp), pelas redes municipal e estadual do Rio de Janeiro, pelos municípios de Duque de Caxias, Nova Iguaçu e Niteroi, pelas escolas particulares do Paraná e pela rede estadual do Rio Grande do Sul, apenas para citar alguns exemplos. O Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (Sieeesp) também recomendou às cerca de dez mil entidades filiadas que adiassem o reinício das aulas. O Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp) enviou comunicado aos seus associados sugerindo que “ponderem o contexto em que estão inseridos, a extensão dos danos em seu calendário escolar e, principalmente, a efetiva utilidade de adiarem o retorno às aulas devido ao aumento no número de casos de Influenza A (H1N1) ou gripe suína”.
Já o SINPRO-SP manifestou, em seu site, divergências em relação à medida. “A diretoria do Sindicato dos Professores considera que o adiamento do reinício das aulas em razão do surto da gripe H1N1 é uma medida cujos efeitos podem ser opostos aos da prevenção da saúde dos estudantes”, já que, dentre outros fatores, “as escolas não são os únicos ambientes de convívio coletivo dos jovens: seria preciso, para que a medida fosse consequente, que todos os demais espaços frequentados pelos estudantes também fossem igualmente fechados ao público: cinemas, teatros, clubes, danceterias, shoppings”, diz o texto divulgado pelo Sindicato.
Para contribuir com o debate, o SINPRO-SP conversou com Celso Granato, professor da disciplina de Infectologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Ele fala sobre a ação do H1N1, analisa o estágio da epidemia no Brasil, lembra que as evidências disponíveis até o momento sugerem que o vírus da gripe convencional parece ser mais letal que o H1N1 e comenta a decisão de manter as escolas fechadas por mais quinze dias, além de ressaltar o papel dos professores como agentes da cidadania. “É preciso abrir a discussão sobre a nova gripe nas salas de aula, trabalhando a informação com equilíbrio e responsabilidade, mas sem proibições ou tabus”.