Elisa Marconi e Francisco Bicudo
Ela não foi “branda”, como lamentavelmente escreveu o jornal Folha de S. Paulo, em editorial publicado em 17 de fevereiro de 2009 – ao contrário, a ditadura militar instalada no Brasil por conta do golpe de abril de 1964 foi certamente mais intensa e mais nefasta do que as memórias que foram construídas pelo imaginário popular a respeito do período. Essa é uma das conclusões apresentadas pelo livro O que resta da ditadura, organizado por Edson Teles e Vladmir Safatle. A obra representa um avanço nos debates relacionados ao período militar brasileiro por conseguir, em primeiro lugar, chamar pensadores e intelectuais a refletir sobre os rastros, marcas e ecos da ditadura, que ainda persistem, ajudando a atualizar uma discussão que às vezes vira refém do passado. Mais: esse movimento é feito majoritariamente a partir de uma ótica renovada. “Chamamos intelectuais profundamente ligados ao tema, como o professor Paulo Arantes, filósofo da Universidade de São Paulo, mas também convidamos a psicanalista Maria Rita Khel, que traz uma percepção arejada para a questão”, explica Teles, que é doutor em Filosofia Política pela Universidade de São Paulo e professor da Universidade Bandeirante de São Paulo (Uniban).
Outro passo significativo que a obra deu foi abrir espaço para que a ditadura fosse discutida dentro da academia, de modo aprofundado. A sensação dos autores é que o assunto – de suma importância para o entendimento do que é o Brasil e de quem são os brasileiros – não estava sendo debatido nas universidades e, por isso, não ganhava o mergulho de compreensão que merece. “A idéia era romper alguns pré-conceitos e sensos comuns que fazem da história recente do país um assunto aborrecido, enfadonho. Só refletindo, em profundidade, é que a gente consegue romper essa superficialidade”, lembra Teles. Por fim, O que resta da ditadura oferece uma visão que em nada se aproxima das obras memorialistas que costumam tratar da ditadura militar. É um livro de reflexão e até, de acordo com os organizadores, de ação política, porque pensa e projeta iniciativas futuras.
O SINPRO-SP conversou com o filósofo Edson Teles, no dia seguinte do lançamento do livro. Os melhores trechos da entrevista, você acompanha aqui