Por Francisco Bicudo
No primeiro semestre de 2003, houve um bombardeio no Brasil.
Bancas de jornal, agências de notícias e veículos de comunicação do país noticiaram à exaustão o boom de descobertas da astronomia brasileira. São fotografias que mostram com mais nitidez os primórdios de formação do universo e das galáxias e permitem definir melhor suas idades; estudos que procuram medir, a partir de informações sobre estrelas antigas, a data de nascimento do cosmos, agora estimada em 13 bilhões de anos; pesquisas sobre explosões estelares, buracos negros e jatos astrofísicos também foram assunto na mídia nacional. Aos poucos, novos elementos se juntam para tentar responder a uma das mais antigas perguntas feitas pela humanidade: como, afinal, tudo começou?
O que os jornais, revistas e noticiosos esqueceram de mencionar é que, somadas uma a uma, essas pesquisas colocam o Brasil num patamar de destaque na astronomia e astrofísica mundial. “As colaborações brasileiras são citadas em periódicos internacionais e a participação é expressiva, apesar do investimento financeiro estatal na área ainda ser reduzido”, explica o professor de Astronomia, Walmir Cardoso. Além da façanha que é produzir ciência com recursos reduzidos, os estudos brasileiros trazem ainda contribuições significativas para o desenvolvimento da tecnologia que ajuda a desvendar os mistérios e a natureza que estão contidos na luz de cada estrela. É o caso do telescópio SOAR, que possui um espelho receptor com quatro metros de diâmetro, em que o Brasil é sócio majoritário; o mesmo se dá com os Geminis, telescópios gêmeos – um no hemisfério sul, outro no norte –, cada um com oito metros de diâmetro. São eles que permitem que se enxergue o universo com mais clareza e definição.
Outra conquista verde e amarela que sacudiu o meio científico mundial foi a comprovação dos estudos do astrofísico Augusto Daminelli, da Universidade de São Paulo (USP). Contrariando a maioria dos astrônomos, ele confirma que Eta-Carinae, uma das estrelas mais antigas da nossa galáxia, é, na verdade, um sistema binário. Ou seja: são dois corpos girando um ao redor do outro. O feito é uma façanha, já que o pesquisador fez suas previsões a partir de um telescópio pequeno instalado em Brasópolis, Minas Gerais. Mais importante: apontou respostas a perguntas feitas há mais de um século. O astro, que fica há mais de 7.500 anos-luz da Terra, estava envolvido numa grande polêmica em relação a sua massa. Daminelli concluiu em 1997 que Eta-Carinae tem uma diminuição regular em seu brilho a cada 2.020 dias, e estimou que a seguinte deveria acontecer entre 25 e 30 de junho de 2003. E não teve erro. No domingo, 29, a estrela piscou. O fenômeno provou que Eta-Carinae é um sistema binário porque um só corpo, de massa tão colossal, não seria capaz de ter uma flutuação de brilho tão precisa e regular. Ou, em palavras do próprio pesquisador, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo (02/07/2003): “Um elefante não é capaz de dançar mantendo o ritmo”.
A professora e pesquisadora do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG/USP), Silvia Rossi, acredita que novidades e descobertas acontecem todos os dias quando o objeto de estudo é o céu. No entanto, completa, a explosão de notícias vem acontecendo porque “a mídia nos descobriu. O tema mexe com conceitos de tempo e espaço diferentes dos que estamos acostumados, por isso já atrai bastante público. Todo mundo tem curiosidade de saber como nascem, crescem e morrem as estrelas”, diz. De outro lado, ela confirma que há sim um crescimento nas descobertas, resultado do avanço tecnológico verificado em observatórios espaciais e na construção de espelhos para telescópios.