As intervenções militares norte-americanas na região do Oriente Médio e suas relações com atos de terror foram também alvos de críticas de especialistas que participaram de um outro debate, desta feita exibido pelo programa “Globonews Painel”, comandado pelo jornalista William Waack. Gilberto Dupas, coordenador do Grupo de Conjuntura Internacional da Universidade de São Paulo (USP), disse que, para os EUA, o terrorismo é um câncer que precisa ser removido com cirurgia radical, eliminando-se também todos os seus gânglios e metástases. Segundo ele, essa lógica belicosa e intervencionista parte do pressuposto de que é possível modificar unilateralmente as culturas e civilizações. “Os americanos acreditam de fato nessa hipótese. E se decepcionam quando acontece um atentado, que mostra o tamanho do engano deles”. Na opinião de Reginaldo Nasser, coordenador do curso de Relações Internacionais da PUC-SP, a ocupação norte-americana do Iraque é ilegítima. Nenhum dos argumentos utilizados para justificar a guerra, lembra, se sustentaram. As armas de destruição em massa não foram encontradas. Também não foram provadas as supostas relações entre o regime de Saddam Hussein e a organização terrorista Al Qaeda. “Os Estados Unidos deixaram o Estado iraquiano se destruir, destroçando seu aparato institucional. Agora, estão pagando o preço”.
Para os especialistas, o atentado suicida que matou o diplomata brasileiro Sergio Vieira de Mello evidenciou a encruzilhada em que se encontra a ONU. Para Nasser, a Organização das Nações Unidas chegou ao Iraque para cumprir missão humanitária; mas, para garantir a própria segurança, precisava de tanques nas ruas. “É muito complicado querer atuar nesse cenário de ambigüidade”, afirmou. Peter Demant, historiador e professor de Relações Internacionais da USP, e também participante do debate, lembrou que, para a população iraquiana, a ONU era aliada dos EUA e, portanto, inimiga do Iraque. “Era vista como um braço da ocupação e instrumento da invasão norte-americana”, destacou.
Ao abrir espaço para a discussão de temas tão relevantes, os dois programas mostram que existe vida inteligente na televisão brasileira, e que a programação que chega às telinhas pode, sim, contribuir com a democratização da informação. Lamentável apenas o fato de que se trata de dois programas exibidos por canais de TV a cabo, de alcance, portanto, limitado. E, apesar de toda a tensão e profundidade de análises que marcou os dois debates, foi possível chegar ao fim deles com mensagens de esperança. Gilberto Dupas afirmou que o fracasso dos EUA no Iraque pode representar um ponto de reversão na onda conservadora que tomou conta da sociedade norte-americana. “Talvez seja possível descolar a imagem do país das pretensões políticas da administração Bush”. Otimista, Sader disse que é preciso continuar sonhando. “E continuar lutando escrupulosamente para colocar esses sonhos em prática”, finalizou.