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Entrevista com Mayana Zatz, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano

O QUE É E COMO PODEMOS ENTENDER A LEI DE BIOSSEGURANÇA QUE PASSARÁ AGORA PELA SEGUNDA VOTAÇÃO NA CÂMARA FEDERAL?
Essa lei, que já foi aprovada uma vez na Câmara, já passou pelo Senado e agora está voltando para a Câmara, trata de assuntos polêmicos, que vão desde a regulamentação para o plantio de soja transgênica até as pesquisas com células-tronco. Eu posso falar mais sobre essa segunda. Nosso pedido ao governo brasileiro é que possamos realizar pesquisas com células-tronco embrionárias. As pesquisas com células-tronco adultas já são permitidas e não há nenhuma discussão em torno delas. Então nosso pedido era para realizar pesquisas com as células-tronco obtidas a partir de embriões que seriam descartados por estarem congelados, ou por serem inviáveis. Para produzir células-tronco a partir desses embriões, é preciso aplicar a técnica da clonagem terapêutica. A clonagem transfere o núcleo de uma célula da pele, por exemplo, para um óvulo sem núcleo. Se esse óvulo se dividir e se multiplicar, então teremos as células-tronco, iguais às células embrionárias, que podem se transformar em todos os tecidos do corpo humano.

A LEI QUE ESTÁ PARA SER VOTADA AGORA É MUITO AMPLA E TRATA DE ASSUNTOS DIVERSOS NO MESMO TEXTO. FALA DE TRANSGÊNICO, AO MESMO TEMPO EM QUE TRATA DE TERAPIA COM CÉLULAS-TRONCO. ISSO NÃO É UM PROBLEMA?
A primeira proposta de Lei de Biossegurança não permitia nada, e ainda confundia todas as técnicas. Assim, teve essa proposta que está tramitando agora e que, embora trate de tudo ao mesmo tempo, os cientistas que estão acompanhando todo o processo a aceitaram assim, porque se a lei fosse transformada em duas – uma para tratar de transgênicos, outra para as células-tronco –, demoraria muito mais. Mas o importante é que as duas discussões têm um ponto em comum, que é a liberdade para fazer pesquisa. Seja com transgênicos, seja com células-tronco.

A LEI FALA EM PRAZOS PARA PERMITIR A UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES, A SENHORA PODE EXPLICAR?
A proposta é que se possa utilizar para produzir células-tronco os embriões que estejam congelados há pelo menos três anos, ou aqueles que são inviáveis, que não vingariam mesmo.

OU SEJA, SE A LEI FOSSE DEFINITIVAMENTE APROVADA HOJE, PODERÍAMOS COMEÇAR AS PESQUISAS COM EMBRIÕES QUE TIVESSEM SIDO CONGELADOS ATÉ 2001, E JÁ PODEREMOS COMEÇAR A CONGELAR OUTROS PARA SEREM USADOS A PARTIR DE 2007?
É isso, mas é bem polêmico. O projeto de lei do Senador Tião Vianna (PT-AC) ainda vai além. Ele propõe que se restrinja a produção para no máximo dois embriões em cada procedimento, assim, não sobraria nada para ser congelado, ou descartado. Se isso for aprovado, não só se inviabiliza toda pesquisa com células-tronco, como também a fertilização assistida. As clínicas normalmente produzem, pelo menos, quatro embriões. Em 30% dos casos, depois de implantados, vinga apenas um. Reduzir esse número pela metade é acabar com as chances de muitos casais.

VAMOS RETOMAR AQUI A QUESTÃO ÉTICA. ESTAREMOS CLONANDO VIDAS HUMANAS SE OS PROCEDIMENTOS FOREM FEITOS COMO MANDA A LEI? COMO FICAM AS RESISTÊNCIAS À CLONAGEM?
É muito importante lembrar que a produção de células-tronco embrionárias é feita a partir de embriões que seriam descartados, por estarem congelados há muito tempo e, portanto, impróprios para gerarem bebês, e também com embriões inviáveis, que também não resultariam em embriões do mesmo jeito. Seriam descartados. Há uma minoria religiosa que prega contra a técnica por defender que um embrião é um ser humano como outro qualquer, com personalidade jurídica constituída e, portanto, com os mesmos direitos de um ser humano já nascido. Não são muitos, são uma minoria. Uma minoria que berra, é verdade, mas minoria. Defendem o ponto de vista da Igreja Católica, que é contra o divórcio, a camisinha, que não se atualizou. Se a gente olhar para a lei brasileira, vai ver que o DIU (Dispositivo Intra-Uterino, método anticoncepcional) é permitido por lei. Esse mesmo DIU impede a fixação do blastocisto, que é o embrião de 5 dias, no útero da mulher. Ou seja, se o embrião foi formado e a mulher usa DIU, esse embrião não vai vingar. E isso a lei permite. E se vivemos num estado laico, proibir pesquisas porque um grupo de religiosos é contra não faz sentido. Eu sempre digo que se fosse uma criança da família dessa minoria contrária que estivesse morrendo em cima de uma cadeira de rodas, eles pensariam bem diferente e talvez percebessem qual vida devemos salvar.

DIGAMOS QUE A LEI DE BIOSSEGURANÇA SEJA MESMO APROVADA, CONTEMPLANDO TRANSGÊNICOS E PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO. QUEM VAI FISCALIZAR TUDO ISSO? O GOVERNO FEDERAL, O MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, OU DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA?
Acreditamos que serão os Comitês de Ética, como os que já existem e já trabalham hoje, os locais e o federal. Hoje eles ainda não têm o poder de julgar algumas questões porque a lei ainda não foi regulamentada.

NO dia 09 DE OUTUBRO, MORREU O ATOR AMERICANO CRISTOPHER REEVE, UM DOS MAIORES DEFENSORES DAS PESQUISAS COM AS CÉLULAS EMBRIONÁRIAS, NO INÍCIO DE OUTUBRO, OS MÚSICOS HERBERT VIANNA, DO PARALAMAS DO SUCESSO, E MARCELO YUCCA, EX-BATERISTA DO RAPPA, SUBIRAM AO PALCO DO “MTV VÍDEO MUSIC AWARDS” PEDINDO A APROVAÇÃO DA LEI DE BIOSSEGURANÇA PARA QUE AS PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO TIVESSEM CONTINUIDADE. ENFIM, MUITA GENTE, MUITAS FAMÍLIAS ESTÃO DEPOSITANDO SUAS ESPERANÇA PARA A CURA, OU RECUPERAÇÃO DE UM ENTE, NESSAS PESQUISAS. O QUE A TERAPIA COM CÉLULAS-TRONCO PODE REALMENTE PROPORCIONAR? ATÉ QUE PONTO PODEMOS CHEGAR?
O que as células-tronco podem realmente fazer é se transformar em todos os tecidos do corpo humano. Então os pesquisadores poderão fabricar esses tecidos e substituir tecidos danificados, ou regenerá-los. Parece muito com o transplante de órgão. A terapia com células-tronco segue essa linha do transplante de órgãos. É um aprimoramento. Só que em vez de ter que esperar alguém morrer e trocar o órgão inválido por outro, com todas as complicações que isso traz, vamos, no futuro, fabricar tecidos e órgãos compatíveis com todos. Eu trabalho com distúrbios neuromusculares. Na minha área vamos poder regenerar músculos. A técnica também será válida para o tratamento da leucemia, a partir da produção de uma nova medula óssea. Também para a reconstituição da medula espinhal e por aí vai. Mas isso é futuro. Não queremos desanimar ninguém, mas temos que alertar que tudo isso ainda é pesquisa. Pesquisa. Primeiro precisa ser testado em animais, depois com humanos e vai demorar um pouco até que seja um procedimento comum.

Leia mais:
Câmara vai analisar mudanças na Lei de Biossegunça(Agência Câmara)
Transgênicos e pesquisa com células-tronco são aprovados pelo Senado(Agência Senado)
Politicamente modificada (revista eletrônica O Eco)

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Discutindo a biossegurança
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