Embora o senhor seja diretor do Museu, não esconde que o seu grande prazer é ir a campo para procurar fósseis de vertebrados do período Cretáceo. A partir dessas visitas e das descobertas feitas, é possível descrever como era o Brasil há cerca de 100 milhões de anos atrás?
Diógenes de Almeida Campos – O início do período Cretáceo marca também o início da separação entre a América do Sul e a África que, até então, eram unidas. Também nesse período ainda não havia a Cordilheira dos Andes. Então podemos dizer que a América do Sul era um enorme Brasil. O oceano, que hoje chamamos de Atlântico, começa a surgir nessa separação entre África e América. Também é nesse momento que as bacias que produzem petróleo começam a se formar. É o caso de Campos, no Rio de Janeiro, e da Bacia do Recôncavo, na Bahia.
E a paisagem, professor?
Bem, o Brasil estava coberto de florestas, mas não as florestas como conhecemos hoje. Eram bem diferentes. Porque naquele tempo não havia flores. O que tínhamos eram basicamente samambaias e coníferas.
Quem eram os habitantes dessas florestas estranhas e sem flores?
Quem dominava eram os dinossauros e seus companheiros, como os pterossauros, crocodilos e répteis marinhos. Mas também esses animais eram diferentes dos de hoje. Os crocodilos eram enormes, e os répteis tinham dentes muito mais afiados. Também havia peixes, e eles também eram diferentes. Eles tinham muito mais escamas que os de hoje. Tudo isso nós encontramos nos fósseis que achamos em regiões como a Chapada do Araripe e no Recôncavo Baiano. Esses fósseis são muito bonitos e se encontram em ótimo estado de conservação.
Também era mais quente por aqui?
Sim. Em média, uns 5oC mais quente. Hoje a nossa média é de 13oC e, naquele tempo, chegava a uns 18oC. o resultado é que havia menos geleiras nos pólos e nenhuma geleira no topo das montanhas.
E aí veio a separação dos continentes...
Veio a separação. E, com ela, também as faunas se separam e ficam bem definidas. Chega também uma grande novidade nas florestas, que, aliás, eram enormes. Surgem as flores. Claro que não eram rosas e cravos, eram mais parecidas com as pinhas, mas já tinham pétalas e já atraiam insetos.
Como o senhor consegue dizer como eram as flores?
Tudo isso a gente encontra nos fósseis. Flores, insetos e animais. E é muito bonito encontrar essas flores de pedra, é a gravação em rocha da beleza da natureza.
Mas as flores não serviram só para embelezar. Elas tiveram um papel estratégico, certo?
Certo. As plantas com flores pouco a pouco vão desalojando as que não têm flores. Porque a semente de quem tem flor vai muito mais longe de carona com os insetos, assim elas vão ganhando espaço, conquistando a Terra. As que não têm flores vão sendo empurradas para lugares distantes e frios e com elas vão os dinossauros. Nas florestas com flores ficam os mamíferos e as aves. Os dinossauros vão junto com as plantas sem flores. Começa aqui a grande diversidade de vegetais e, com ela, a alegria dos mamíferos que vão, devagarzinho, ocupando cada vez mais espaço. Também já temos a presença de primatas, que seriam os tataravôs dos macacos, nossos primos. Os macacos mesmo só surgiram há cerca de 50 milhões de anos e, depois deles, o homem.