Bagunça organizada, quais as histórias que os arquivos agora não mais secretos do Deops são capazes de nos contar?
Em primeiro lugar, a pesquisadora faz questão de destacar que os documentos revelam uma atividade intensa e sistemática, inclusive durante os chamados períodos democráticos, desfazendo o mito de que as investigações e bisbilhotagens se concentrariam apenas nos momentos autoritários.
Enquanto existiu, o órgão dedicou-se a vigiar e acompanhar a vida alheia. Essa trajetória permite visualizar quais eram as preocupações dos agentes da repressão. E elas vão desde possíveis espionagens alemãs durante a II Guerra Mundial, passam pelas greves e manifestações de rua, chegando até os seqüestros e as ações dos grupos armados, depois do golpe de 1964.
Apesar das variações que seguem as épocas histórias, há um tema que está sempre presente, durante as quatro décadas: a preocupação com o “avanço do comunismo”. Se os documentos revelam o “Deops way of life”, por outro lado escancaram também aquilo que a historiadora chama de reverso da medalha: a possibilidade de se conhecer com mais detalhes a própria trajetória dos movimentos de resistência e oposição. “O Deops apreendia e arquivava muitos documentos de partidos de esquerda e de organizações clandestinas. Paradoxalmente, e ainda bem, esse material todo acabou sendo preservado pela repressão. E há muito ainda o que se descobrir sobre ele”.
Ela lembra ainda que é possível perceber, pela documentação, como funcionava a lógica e a cabeça de um agente do sistema, o famoso “araponga”, que muitas vezes passava horas e horas trabalhando, sem conseguir produzir algo que fosse realmente útil para os propósitos dele. Maria Aparecida conta que há relatórios onde se lê “fulano saiu de casa, pegou o carro, saiu pela rua tal em direção à avenida tal, parou na banca de jornal, voltou para o automóvel, acendeu um cigarro...”. São, segundo ela, peças descritivas e improdutivas, que não serviam para nada. “Gastou-se muito dinheiro com ações inócuas”, reforça.