envie por email 

"A categoria dos professores precisa ser valorizada"

Depoimento de Selma Garrido Pimenta, diretora da Faculdade de Educação da USP
Por Elisa Marconi e Francisco Bicudo

“Contemporaneamente, falamos muito em sociedade da informação e sociedade do conhecimento. É um dos debates mais atuais. Antes de mergulhar nessa discussão, no entanto, é preciso estabelecer uma significativa diferença conceitual entre as duas instâncias. A informação está presente nas sociedades de um modo geral. Graças ao avanço das tecnologias, qualquer cidadão pode ter acesso, em tempo real, a uma imensa quantidade de informações. É uma avalanche. Basta lembrar da internet e do número de canais de TV a cabo existentes e disponíveis para uma parcela ainda reduzida, mas significativa, da população. No entanto, a informação, por si só, não forma e não educa. É preciso que exista um consistente e sustentado trabalho de análise, de identificação de fontes geradoras, de contextualização, de comparação, para que se possa então promover uma leitura crítica sobre essa informação. É quando ela se transforma em conhecimento. Portanto, há um trabalho educativo a ser desenvolvido com os alunos, com objetivo de incentivar a capacidade de pensar.

Nessa linha de raciocínio, o trabalho dos professores – e das escolas – seria realizar essa mediação reflexiva sobre esse acúmulo de informações, promovendo a transformação desse repertório acumulado em conhecimento humano. Se esse é o desafio, está colocada a necessidade de que os professores sejam também bem formados. Ser educador não é um trabalho simples, não é uma profissão para qualquer um. As escolas, afinal, lidam com diversas áreas do conhecimento, que são justamente instrumentos para essa possível e complexa tarefa de compreensão e interpretação do mundo. Mas é preciso estar bem preparado para lidar com essas ferramentas.

Valorização do docente
O trabalho de formação do educador, portanto, é muito importante. Não pode ser simplesmente resolvido pelo aprendizado instrumentalizado, que diz que basta passar informações em estado bruto e ponto final. Os professores têm de ter muito bem resolvida a capacidade de pensar e a disposição para aprender e interagir com seus alunos. Trata-se de um espaço de formação constante e coletivo.

É preciso, assim, que as escolas estejam abertas e dispostas a abrir espaço para esse trabalho coletivo, para que o processo de formação de seus educadores possa ser o resultado de uma reflexão compartilhada, já que, vale repetir, essa atividade não mais se resume a entrar na sala e ministrar uma aula.

A categoria dos professores precisa ser valorizada. São profissionais e dessa forma devem ser entendidos. Precisam de salários dignos e de boas condições de trabalho. Precisam perceber que há possibilidades de formação continuada dentro das escolas, que há espaço para novos estudos, capazes de fazer frente e dar respostas, ainda que mínimas, para os novos dilemas e desafios que o mundo vai nos colocando. As sociedades contemporâneas são marcadas por polêmicas e complexas situações e discussões, como a violência, o esgarçamento das relações pessoais e sociais, os cenários competitivos, a ênfase no sucesso individual, e o professor precisa estar preparado para compreender todas essas mudanças e para trabalhar todos esses temas, em sala de aula, com seus alunos, sempre na perspectiva de valorização da cidadania e da justiça social.

Avanços
Essa compreensão repercute imediatamente nos cursos e nas instituições de ensino que formam esses educadores. A boa notícia é que, a partir da década de 1980, graças a diversos movimentos educacionais, conseguimos garantir que a formação de todo e qualquer professor aconteça exclusivamente em nível superior. A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 contempla essa bandeira, que nós consideramos um avanço. Claro que é preciso pensar na qualidade, e não basta apenas que sejam cursos superiores. Existem cursos de qualidade e questionáveis em instituições públicas, o mesmo acontecendo com o setor privado. É verdade ainda que a criação indiscriminada de algumas instituições, como os Institutos Superiores de Educação, virou as costas para um elemento imprescindível para a formação desses educadores, que é a questão da pesquisa.

Para formar o professor que é capaz de transformar informação em conhecimento, não se pode abrir mão da pesquisa acadêmica, com viés social. Nesse sentido, a instituição formadora tem de guardar uma relação bastante estreita com as escolas que já existem. Dessa forma, os alunos das universidades, futuros professores, teriam contato com as diversas correntes de pensamento e teorias, mas poderiam dialogar diretamente com a prática existente nas escolas. Essa realidade concreta e já existente seria um possível objeto de investigação e de análise. A pesquisa e a reflexão seriam, portanto, o eixo condutor dessa formação do educador.

Investimento na formação
Claro que é uma formação que exige investimento, das mais diversas naturezas. Formar professor não é nada simples. Mas, se não fosse dessa maneira, estaríamos promovendo a formação de arremedos de educadores. Se é possível, concretamente, perseguir e aplicar essas idéias e propostas? Olha, já há uma série de universidades, no Brasil e no exterior, que vem conseguindo avançar nesse trabalho formativo que estimula o espírito questionador e crítico. Esse modelo exige compromissos, especialmente das redes pública e particular, para que se possa firmar convênios e parcerias, que resultem, por exemplo, em estágios.

Funcionaria da seguinte maneira: para os futuros professores, esse intercâmbio representaria a possibilidade não apenas de observar e de fazer a crítica, mas de travar contato com aqueles que vivenciam a realidade cotidiana da profissão. Para estes segundos sujeitos, já na ativa, no mercado de trabalho, seria uma porta aberta para a formação continuada.O ganho é duplo.

Vale lembrar, por fim, que a licenciatura continua a ser, por definição, o espaço privilegiado e adequado para a formação de professores. Tradicionalmente o que acontece é que o aluno que faz, por exemplo, Geografia ou Matemática, conclui antes aquilo que chamamos de disciplinas técnicas ou específicas, para somente depois cursar a parte pedagógica, nas Faculdades de Educação. O que nós estamos propondo, e já há experiências concretas nesse sentido, é que as formações específica e pedagógica caminhem em sintonia e em consonância, simultaneamente, e já desde os primeiros momentos do curso.

Insisto: é um trabalho complexo, delicado, que deve ser construído coletivamente. É preciso ter clareza do profissional cidadão que se deseja formar. Para terminar: já não basta mais simplesmente entrar em sala de aula e despejar a matéria. Essa perspectiva precisa ser superada, com urgência”.

Leia também
Os sete saberes de Edgard Morin
"O professor deve ser mais que um instrumento a serviço do sistema educacional"
"O professor precisa assumir a responsabilidade do processo de ensino e aprendizagem"
"É preciso que o professor reflita constantemente sobre seu papel"
"A construção da cidadania deve ser sempre a essência do papel do professor"
"O professor futuro, o professor de hoje"
"O professor deve deixar de ser apenas um transmissor de conhecimento"
"O professor continua a ser o protagonista educacional"


ver todas as anteriores
| 03.02.12
De onde viemos

| 11.11.11
As violências na escola

| 18.10.11
Mini-Web

| 30.09.11
Outras Brasílias

 

Atualize seus dados no SinproSP
Logo Twitter Logo SoundCloud Logo YouTube Logo Facebook
Plano de saúde para professores
Cadastre-se e fique por dentro de tudo o que acontece no SINPRO-SP.
 
Sindicato dos Professores de São Paulo
Rua Borges Lagoa, 208, Vila Clementino, São Paulo, SP – CEP 04038-000
Tel.: (11) 5080-5988 - Fax: (11) 5080-5985
Websindical - Sistema de recolhimentos